terça-feira, 13 de julho de 2010

Porque eu me imaginava mais forte...


Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil. É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a solenidade ritualiza a incompreensão e a transforma em oferenda. E é também porque sempre fui de brigar muito, meu modo é brigando. É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu queria amar o que eu amaria - e não o que é. É também porque eu me ofendo a toa. É porque talvez eu precise que me digam com brutalidade, pois sou muito teimosa. É porque sou muito possessiva e então me foi perguntado com alguma ironia se eu também queria o rato para mim.

Talvez eu me ache delicada demais apenas porque não cometi os meus crimes. Só porque contive os meus crimes, eu me acho de amor inocente.

Talvez eu tenha que chamar de "mundo"esse meu modo de ser um pouco de tudo.

Eu, que sem nem ao menos ter me percorrido toda, já escolhi amar o meu contrário(...). Eu que jamais me habituarei a mim, estava querendo que o mundo não me escandalizasse. Porque eu, que de mim só consegui foi me submeter a mim mesma, pois sou tão mais inexorável do que eu, eu estava querendo me compensar de mim mesma com uma terra menos violenta que eu."





Clarice Lispector

3 comentários:

  1. Parabéns Nívea, além de ajudar as pessoas por meio deste "site", você tem bom gosto. Felicidades. B. Borges

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  2. Muito bom esse negocio aki heim gata!!!!


    Parabens estou estudadno por aqui e to apredendo muito!!!


    Bjosss

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  3. Ufa, quanto vigor! Que mergulho corajoso nas próprias entranhas... Ela está descrevendo alguma personagem ou fala dela mesma?

    Sem querer ser abusivo, profª Nívea, você poderia me ajudar a identificar esse texto dentro da obra da autora? Gostaria de compreender melhor todo o seu contexto.

    Tenho alma técnica, direcionada para as matemáticas e a língua portuguesa foi, por muito tempo, um bicho-papão para mim, porém, ultimamente, ando encontrando muito prazer nas letras, principalmente quando insinuo minha "prancha" por aqui.

    Quero, se possível for, degustar esse texto por inteiro, sem perder nenhum fiapinho...

    Mais uma vez sua sensibilidade me emocionou.

    Parabéns!

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